Neste texto, abordo um dos conjuntos de
perturbações psiquiátricas mais incapacitantes, tanto pelo nível de gravidade
da incapacidade, como pela diversidade de áreas funcionais que afecta, nas
quais, tantas vezes, torna o indivíduo incapaz. Numa tentativa e luta, que deve
ser constante, para tentar desmistificar ao máximo a visão leiga das
perturbações mentais, em particular das perturbações depressivas. Concordando
com este facto, está a posição da OMS (Organização Mundial de Saúde) que
afirmou especular que, em 2020, as perturbações depressivas sejam a segunda
causa de carga global de doença a nível mundial, apenas ultrapassadas pelas
doenças cardiovasculares. Para além disso, rotulou a depressão como a principal
causa de incapacidade individual. Devido a esta globalização, a doença tem sido
apelidada de “constipação da mente”.
Há
sinais e sintomas (semiologia) que se associam directa e espontaneamente à
depressão, mesmo em contextos de senso comum, tais como: tristeza (sem margem
para dúvida, o mais evidente e comum), sofrimento, descrença, falta de
motivação… e outros tantos que nos vêm imediatamente, ou pouco depois, à
cabeça, sempre que ouvimos termos da família da palavra “depressão” (deprimido,
depressivo, etc.), independentemente do contexto, da companhia ou do assunto
correspondente. Ora, é realmente necessário esclarecer que, num quadro clínico
de depressão, estes sinais e sintomas, conhecidos e declarados pelo senso
comum, não são, por si só, critério suficiente para afirmar o diagnóstico de
patologia, no mínimo, em 99,9% dos casos. Mas estão ou não tais sinais e
sintomas presentes nos quadros de perturbações depressivas? Sim, sem qualquer
dúvida. A tristeza, o sofrimento, a descrença, a falta de motivação, etc.,
estão quase sempre presentes em pacientes diagnosticados com quadros
depressivos, e é necessário estar particularmente atento a todos eles. No
entanto, existem centenas de outros sinais e sintomas, que podem surgir
associados a este tipo de quadros, e que nos podem ajudar a complementar e
aprofundar o diagnóstico de uma perturbação depressiva, com determinada
classificação e especificação, fazendo uso da melhor diferenciação entre
depressão (patologia/doença) e tristeza (normalidade) (abordarei esta
necessária e complexa diferenciação numa publicação posterior).
Como já referi, a depressão é uma doença
real, que deve ser encarada como outra patologia indubitável qualquer, e que
afecta diversas áreas do funcionamento humano (em casos extremos, pode mesmo
afectar todas). Ou seja, de um modo geral, podem ser apresentados conjuntos de
sinais e sintomas pertencentes a quatro grandes grupos: emocionais, cognitivos,
físicos e comportamentais (P. Afonso, 2015). Sendo que estes podem perturbar
significativamente (e, geralmente, perturbam mesmo) o funcionamento normal do
indivíduo em três grandes contextos: pessoal, social e profissional.
Tendo
isto em conta, apresento, de seguida, um conjunto, que penso ser relativamente
abrangente (um conjunto realmente abrangente seria muitíssimo difícil e um
totalmente abrangente seria praticamente impossível), de possíveis sinais e
sintomas na generalidade dos quadros depressivos, que podem fazer variar o
quadro e/ou especificação que é reconhecido no doente.
Conjunto de Sinais e Sintomas Possíveis na Generalidade dos Quadros
Depressivos
Emocionais
Humor deprimido; tristeza efectiva e
persistente; falta de esperança no futuro; pessimismo geral; choro fácil;
labilidade emocional; incapacidade de adequar o estado de ânimo ao ambiente do
momento; irritabilidade; agressividade; anestesia afectiva; anedonia;
auto-desvalorização; culpabilização gratuita; pensamentos obsessivos ou
delirantes; disprosódia; fixação ruminatória no passado; auto-condenação;
remorso; dúvida sobre se vale a pena continuar a viver; desejo de morte visto
como única solução; ausência de motivação e de iniciativa; sensação de mente
vazia; sentimento de solidão constante;
Cognitivos
Perturbações da memória; baixa no
rendimento e na productividade intelectual/profissional/escolar; confusão;
dificuldades de atenção e concentração; distracção fácil, com tendência a
“fugir” para pensamentos negativos; incapacidade de fixação;
Físicos
Dores corporais; perturbações
gastro-intestinais; cefaleias (dores de cabeça); disfunções sexuais; perda de
peso; falta de energia; cansaço fácil/fadiga persistente; ansiedade com todos
os seus componentes (palpitações, aperto no peito, tremores, tonturas, suores,
etc.); insónia ou hipersónia; falta de desejo sexual ou disfunções sexuais:
anorgasmia (nas mulheres) e impotência (nos homens), expressão facial e
aspecto abatidos;
Comportamentais
Lentificação ou inibição motora; ausência
de iniciativa motora voluntária; passagem de grande parte do tempo sentado ou
deitado; adiamento sistemático de diversos tipos de tarefas; sentimento de que
tudo acarreta enorme esforço; mímica triste, com ausência de sorriso; aspecto
descuidado; desinteresse pela auto-imagem; perda de hábitos de higiene;
alterações do comportamento alimentar; apatia geral; possível “estupor
melancólico”; isolamento social; abuso de substâncias; inquietação/agitação;
dificuldade em manter-se no mesmo sítio, sem motivo aparente; auto e/ou
hétero-agressão.
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